[Enrola o cabelo. Fica esfregando uma perna na outra]
– O quê foi?
– Quê?
– Que você está assim, agitada?
– Nada.
– Tá.
[Ele, lendo. Ela, olhando o nada com o olhar perdido]
– Amor, você gosta de mim?
[Ele levanta os olhos do livro e a olha de esgueio] – Gosto.
– Mas eu falo gostar mesmo, gostar de verdade. Tipo, amor, sabe?
– Gosto, “tipo amor”.
[Levanta as sobrancelhas balbuciando um “hum” de quem entendeu]
[Escorrega pela cabeceira da cama, deita. Vida para um lado, depois para o outro. Vai ao banheiro. Ele não sabe e nem se
interessa em saber o que ela foi lá fazer, mas vê de relance todas as luzes acesas: a do teto, as em volta do espelho e uma
extra que ela mandou colocar dizendo que era melhor para se maquiar]
[Ela volta. Escovou os cabelos e tinha no ar um aroma de menta, havia também escovado os dentes]
– Amor…
[Desinteressado] – Hum?
– O que você gosta em mim? Por quê você gosta de mim?
– Não sei. Porque você é inteligente? Acho que é por isso.
– Você só gosta da minha inteligência?
[Estafado] – Não. Gosto do seu jeito de andar, da forma como gesticula com as mãos, do um jeito bonitinho que você sorri…
Ahn… É isso.
[Insatisfeita] – Hum
– O quê você mais gosta dessas coisas de mulher?
[A esta altura ele já larga o livro no colo, não há maneira de concentrar-se]
– Que tipo de coisas, características?
[Debocha] – Não, essas eu já sei, né.
– Roupas, acessórios, enfim, essas “coisas de mulher”.
– Ah. Gosto de saia, dessas blusas igual sua amiga estava usando hoje, gosto também desses sapatinhos que você usa e de
lingerie.
[Levanta só uma das sobrancelhas] – Então você gostou dela? Achei que ia gostar mesmo…
– Você namoraria uma ruiva?
[Ri e passa a mão pelos cabelos] – Se não tivesse aquela cor de puta pegando fogo, sim.
– Morena?
– Que pergunta idiota.
– É, tá bom.
– Loira?
– Já namorei.
– Colorida?
[Ri e fica com olhar de quem quase pode materealizar a imaginação] – Depende, né.
– Você ia gostar de mim se eu deixasse o cabelo bem comprido?
[Aponta para a capa de uma revista caida no chão] – Igual aquele ali.
– Até ia, mas gosto mais dele assim.
– E bem curto, curtíssimo, raspado?
– Ia ficar feio, mas cabelo cresce né.
[Deita na cama. Se contorce e pega a revista sem descer. Folheia, para em uma página]
– E se eu fosse com você numa festa usando essa roupa?
[Olha ressabiado, meio sem saber o que dizer]
– A roupa é bonita, mas não ia ficar bom né.
– Não combina comigo?
[Tenso] – Ah, você sabe. Bom, se veste como quiser.
[Vira pro o lado, não está mais sentada de frente para o nada. Senta de borboleta, enconstando nas pernas dele, sem apoio
para as costas]
– E seu eu fosse bonita, você ia gostar de mim?
[Continua olhando para frente. Vislumbra uma imagem]